quinta-feira, 8 de abril de 2010

Aula 6 - Exercícios de interpretação e escrita: as questões discursivas


Texto 2
Ser Mulher ...

(Gilka Machado – 1915)

Ser mulher, vir à luz trazendo a alma talhada
para os gozos da vida; a liberdade e o amor;
tentar da glória a etérea e altívola escalada,
na eterna aspiração de um sonho superior...

Ser mulher, desejar outra alma pura e alada
para poder, com ela, o infinito transpor;
sentir a vida triste, insípida, isolada,
buscar um companheiro e encontrar um senhor...

Ser mulher, calcular todo o infinito curto
para a larga expansão do desejado surto,
no ascenso espiritual aos perfeitos ideais...

Ser mulher, e, oh! atroz, tantálica tristeza!
ficar na vida qual uma águia inerte, presa
nos pesados grilhões dos preceitos sociais!

Texto 7
Pagu
Mexo, remexo na inquisição
Só quem já morreu na fogueira
Sabe o que é ser carvão
Eu sou pau prá toda obra
Deus dá asas à minha cobra
Minha força não é bruta
Não sou freira
Nem sou puta...
Porque nem toda feiticeira é corcunda
Nem toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho
Que muito homem
Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque
Fama de porra louca
Tudo bem!
Minha mãe
É Maria Ninguém
Não sou atriz
Modelo, dançarina
Meu buraco é mais em cima
Refrão

Elaboração de questão por Beatriz Soares:

Sabendo-se que o primeiro texto foi escrito em 1915 e o segundo já pertence ao século 21,

a) Identifique neles o(s) interlocutor(es) em comum.
b) Aponte em cada um dos textos características que marcam o contexto social no qual estão inseridos os eu-poemáticos.


a) Os interlocutores em comum são as mulheres à frente de seu tempo, que não aceitam facilmente as convenções sociais, por vezes machistas.
b) Pode-se observar, pelo tom irreverente de ambos os textos, que o contexto social de cada um deles é marcado pela desvalorização da mulher, ainda que esta ocorra de maneira diferenciada em cada um dos contextos. Na época em que Gilka escreveu seu poema (1915), os "pesados grilhões dos preceitos sociais" poderiam ser traduzidos por uma extrema vigilância em relação à figura feminina, que deveria se portar de acordo com as normas da Igreja e da sociedade. A música "Pagu", por sua vez, faz referência a uma mulher contemporânea de Gilka e também muito à frente de seu tempo. A figura modernista retomada serve como modelo para que as mulheres não sejam reduzidas a símbolos sexuais ("nem toda brasileira é bunda"), nem se adaptem ao que a sociedade espera delas.

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