domingo, 1 de agosto de 2010

Aula 16 - O gênero "carta" nos vestibulares - simulado



Simulado Carta

01. (Unicamp 2003) Leia atentamente o poema abaixo, de autoria de Cacaso:

HÁ UMA GOTA DE SANGUE NO CARTÃO POSTAL
eu sou manhoso eu sou brasileiro
finjo que vou mas não vou minha janela é
a moldura do luar do sertão
a verde mata nos olhos verdes da mulata
sou brasileiro e manhoso por isso dentro
da noite e de meu quarto fico cismando na beira de um rio
na imensa solidão de latidos e araras
lívido
de medo e de amor
(Antonio Carlos de Brito (CACASO), Beijo na boca . Rio de Janeiro, 7 Letras, 2000. p. 12.)

a) Este poema de Cacaso (1944-1987) dialoga com várias vozes que falaram sobre a paisagem e o homem brasileiros. Justifique a
referência ao “cartão postal” do título, através de expressões usadas na primeira estrofe.
b) O poema se constrói sobre uma imagem suposta de brasileiro. Qual é essa imagem?

Respostas:

a) 1 ponto para a resposta que assinale que se trata de imagens convencionais, típicas ou estereotipadas daquilo que se convencionou como identidade nacional.
1 ponto para a menção de pelo menos duas das expressões abaixo:
luar do sertão, verde mata, olhos verdes da mulata, sou manhoso
(2 pontos)
b) É a imagem de um brasileiro manhoso, “finjo que vou e não vou”.
(1 ponto)

Respostas possíveis:

a) Cartão postal é uma referencia a elementos considerados típicos do Brasil, assim como o “luar do sertão”, “verde mata” e a “mulata”.
b) Trata-se da imagem do brasileiro como esperto, malandro, “manhoso” ("finjo que vou mas não vou”).


02. (Unesp 2006)

Carta XIII – Ao Rei D. João IV – 4 de abril de 1654

(...)
Tornando aos índios do Pará, dos quais, como dizia, se serve
quem ali governa como se foram seus escravos, e os traz quase
todos ocupados em seus interesses, principalmente no dos tabacos,
obriga-me a consciência a manifestar a V.M. os grandes pecados
que por ocasião deste serviço se cometem.
Primeiramente nenhum destes índios vai senão violentado e
por força, e o trabalho é excessivo, e em que todos os anos morrem
muitos, por ser venenosíssimo o vapor do tabaco: o rigor
com que são tratados é mais que de escravos; os nomes que lhes
chamam e que eles muito sentem, feiíssimos; o comer é quase
nenhum; a paga tão limitada que não satisfaz a menor parte do
tempo nem do trabalho; e como os tabacos se lavram sempre em
terras fortes e novas, e muito distante das aldeias, estão os índios
ausentes de suas mulheres, e ordinariamente eles e elas em mau
estado, e os filhos sem quem os sustente, porque não têm os pais
tempo para fazer suas roças, com que as aldeias estão sempre em
grandíssima fome e miséria.
Também assim ausentes e divididos não podem os índios ser
doutrinados, e vivem sem conhecimento da fé, nem ouvem missa
nem a têm para a ouvir, nem se confessam pela Quaresma, nem
recebem nenhum outro sacramento, ainda na morte; e assim morrem
e se vão ao Inferno, sem haver quem tenha cuidado de seus
corpos nem de suas almas, sendo juntamente causa estas crueldades
de que muitos índios já cristãos se ausentam de suas povoações,
e se vão para a gentilidade, e de que os gentios do sertão
não queiram vir para nós, temendo-se do trabalho a que os obrigam,
a que eles de nenhum modo são costumados, e assim se
vêm a perder as conversões e os já convertidos; e os que governam
são os primeiros que se perdem, e os segundos serão os que
os consentem; e isto é o que cá se faz hoje e o que se fez até agora.
(Padre Antonio Vieira. Carta XIII. 1949.)

O Último Pajé

Cheio de angústia e de rancor, calado,
Solene e só, a fronte carrancuda,
Morre o velho Pajé, crucificado
Na sua dor, tragicamente muda.
Vê-se-lhe aos pés, disperso e profanado,
O troféu dos avós: a flecha aguda,
O terrível tacape ensangüentado,
Que outrora erguia aquela mão sanhuda.
Vencida a sua raça tão valente,
Errante, perseguida cruelmente,
Ao estertor das matas derrubadas!
“Tupã mentiu!” e erguendo as mãos sagradas,
Dobra o joelho e a calva sobranceira
Para beijar a terra brasileira.
(Péthion de Villar. A morte do pajé. 1978.)

02. Embora separados por mais de dois séculos, os textos apresentados
focalizam uma mesma questão social surgida no
Brasil-Colônia, que tem repercussões até os dias atuais. Releia
os dois textos com atenção e, a seguir,
a) identifique a questão social abordada por ambos os textos.


Resposta: Nos dois textos, a “questão social” abordada é a do
tratamento dado aos índios pelos colonizadores.
Vítimas de “rigor” ainda mais brutal do que o dirigido
aos escravos, privados de sua cultura sem ser
beneficiados pela cultura de seus conquistadores, a
cena culminante do soneto de Péthion de Villar
representa o sacerdote indígena clamando pateticamente
contra a traição de seu deus, ao mesmo tempo
em que se entrega ao domínio dos novos
senhores de sua terra.


03. (Enade 2005) Leia trechos da carta-resposta de um cacique indígena à sugestão, feita pelo Governo do Estado da Virgínia (EUA), de que uma tribo de índios enviasse alguns jovens para estudar nas escolas dos brancos.

“(...) Nós estamos convencidos, portanto, de que os senhores desejam o nosso bem e
agradecemos de todo o coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes
nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão
ofendidos ao saber que a vossa idéia de educação não é a mesma que a nossa. (...) Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltaram para nós, eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportar o frio e a fome. Não sabiam caçar o veado, matar o inimigo ou construir uma cabana e falavam nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, inúteis. (...)
Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão concordamos que os nobres senhores de Virgínia nos enviem alguns de seus jovens, que lhes ensinaremos tudo que sabemos e faremos deles homens.”
(BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1984)

A relação entre os dois principais temas do texto da carta e a forma de abordagem da educação privilegiada pelo cacique está representada por:
(A) sabedoria e política / educação difusa.
(B) identidade e história / educação formal.
(C) ideologia e filosofia / educação superior.
(D) ciência e escolaridade / educação técnica.
(E) educação e cultura / educação assistemática.

Resposta: item e). O que o cacique defende não é uma educação formal, superior ou técnica - esses são os modelos criticados por ele, apontados como inconciliáveis com a vida indígena. A questão também não é defender uma educação difusa ou pouco consistente - trata-se de valorizar uma educação não-paradigmática (assistemática). Além disso, o tema principal da carta é a educação própria, adequada a cada cultura (as questões de ideologia, filosofia e política estão presentes para embasar a abordagem principal).

(UFRN – 2006)
Leia o texto abaixo e, com base nele, responda à questão 1.

CARTA A UM JOVEM QUE FOI ASSALTADO

“Foste assaltado. Bem, a primeira coisa a dizer é que isso não chega a ser um fato excepcional. Excepcional é ganhar um bom salário, acertar a loto: mas ser assaltado é uma experiência que faz parte do cotidiano de qualquer cidadão brasileiro. Os assaltantes são democráticos: não discriminam idade, nem sexo, nem cor, nem mesmo classe social. Grande parte das vítimas é das vilas populares. É claro que na hora não pensaste nisso. Ficaste chocado com a fria brutalidade com que o delinqüente te ordenou que lhe entregasse a bicicleta (podia ser o tênis, a mochila, qualquer coisa).
Entregaste e fizeste bem: outros pagaram com a vida a impaciência, a coragem ou até mesmo o medo, não poucos foram baleados pelas costas.
Indignação foi o sentimento que te assaltou depois. Afinal, era o fruto do trabalho que o homem estava levando. Não fruto do teu trabalho até poderia ser 
mas o fruto do trabalho do teu pai, o que talvez te doeu mais.
Ficaste imaginando o homem passando a bicicleta para o receptador, os dois satisfeitos com o bom negócio realizado. É possível que o assaltante tenha dito, nunca ganhei dinheiro tão fácil. E, pensando nisso, a amargura te invade o coração. Onde está o exército? Por que não prendem essa gente?
Deixa-me dizer-te, antes de mais nada, que a tua indignação é absolutamente justa. Não há nada que justifique o crime, nem mesmo a pobreza.
Há muito pobre que trabalha, que luta por salários maiores, que faz o que pode para melhorar a sua vida e a vida de sua família sem recorrer ao roubo ou ao assalto. Mas tudo que eles levam, os ladrões e assaltantes, são coisas materiais.
E enquanto estiverem levando coisas materiais, o prejuízo, ainda que grande, será só material.
Mas não deves deixar que te levem o mais importante. E o mais importante é a tua capacidade de pensar, de entender, de raciocinar. Sim, é preciso se proteger contra os criminosos, mas não é preciso viver sob a égide do medo.
Deve-se botar trancas e alarmes nas portas, não em nossa mente. Deve-se repudiar o que fazem os bandidos, mas deve-se evitar o banditismo.
Eles te roubaram. É muito ruim, isso. Mas que te roubem só aquilo que podes substituir. Que não te roubem o coração."

SCLIAR, Moacyr. Moacyr Scliar (seleção e prefácio de Luís Augusto Fischer). São Paulo: Global,
2004. p. 267-268. (Coleção Melhores Crônicas)
Glossário:
égide: escudo.

04. Considere o trecho:
“Deixa-me dizer-te, antes de mais nada, que a tua indignação é absolutamente justa.” (linhas 19 e 20)
Mudando-se de tu para você o tratamento dado ao destinatário da carta, o período, de acordo com o registro culto da língua escrita, deverá ser reformulado do seguinte modo:

A) Deixa-me dizê-lo, antes de mais nada, que a sua indignação é absolutamente justa.
B) Deixe-me dizer-lhe, antes de mais nada, que a sua indignação é absolutamente justa.
C) Deixa-me dizer-lhe, antes de mais nada, que a tua indignação é absolutamente justa.
D) Deixe-me dizê-lo, antes de mais nada, que a tua indignação é absolutamente justa.

Resposta: item b) Quem diz, diz a alguém (e em terceira pessoa, o pronome para marcar esse objeto indireto é "lhe"), o pronome possessivo para a terceira pessoa é "sua" e o imperativo para terceira pessoa é "deixe" ("deixa tu", "deixe você")

(Fuvest 2009)

Belo Horizonte, 28 de julho de 1942.

Meu caro Mário,

Estou te escrevendo rapidamente, se bem que haja muitíssima coisa que eu quero te falar (a respeito da Conferência, que acabei de ler agora). Vem-me uma vontade imensa de desabafar com você tudo o que ela me fez sentir. Mas é longo, não tenho o direito de tomar seu tempo e te chatear.

Fernando Sabino.

05. Neste trecho de uma carta de Fernando Sabino a Mário de Andrade, o emprego de linguagem informal é bem evidente em:

a) “se bem que haja”.
b) “que acabei de ler agora”.
c) “Vem-me uma vontade”.
d) “tudo o que ela me fez sentir”.
e) “tomar seu tempo e te chatear”.

Resposta: item e), em que é empregada informalmente a segunda pessoa ("te chatear") combinada com o uso informal da terceira pessoa ("seu tempo"). Seguindo a norma culta, esse encontro de duas pessoas gramaticais não seria possível. Além disso, o verbo "chatear" tem caráter coloquial.

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