segunda-feira, 17 de maio de 2010

Aula 5 - Intertextualidades


Exercício de escrita:

Crie uma pequena narrativa que estabeleça uma relação intertextual com quaisquer dos três textos abaixo:

1) Chapeuzinho Vermelho
2) Filme: Cantando na chuva
3) Cantiga de Roda:
Santa Clara clareou
São Domingo alumiou
Vai chuva, vem sol
Sol e chuva casamento da viúva
Chuva e sol casamento do espanhol

O casamento era já inadiável. Aluguel de salão, convites a padrinhos, vestido sob medida, aperitivos, juízes, padres e alianças: tudo devidamente comprado, pago sem prestações, pois vida nova não pode se iniciar no vermelho. Era necessário o branco radiante, irreverente nesses tempos de virgindades largadas - a cerimônia resplandeceria pureza e sacralidade.
Contudo, a mancha de vinho e de alguma infidelidade teve más intenções antes mesmo da despedida de solteiro - se casaria com um homem rico e suficientemente infiel. Infiel, porém suficientemente rico. Uma vez inserida no jogo social, já não podia perder a rodada - as apostas estavam feitas, a sorte lançada.
Lembrou-se de sua feminilidade intacta, flor que desabrocharia ao toque de dedos criminosos. Sujos. Recordou também sua infância, todos os sonhos que juntara, ilusões colecionadas a respeito de temas vários, sobretudo amor. Desde criança, nunca se acostumara à realidade: preferia acreditar no impossível e varrer as decepções para algum canto esquecido da sala de convenções.
Chegado o grande dia, a chuva. Talvez uma metáfora divina para a lavagem da alma, os erros perdoados, infidelidades que escorreriam pelo ralo, enquanto lágrimas jamais derramadas denunciariam o risco de botar a perder a maquiagem e o marido. Esperava no carro, atraso de noiva e a tempestade impeditiva. Seria possível que ninguém houvesse trazido guarda-chuva, em função de um dia que se anunciara radiante?
Raíssa não pode resistir ao apelo da torrencialidade das águas. Desafiando a pompa da cerimônia e os interesses dos convidados, saiu. Correu. Cantou. Entregou-se à chuva, vestido de noiva convertido em papel-machê, rosas despetaladas, cílios postiços atirados contra o vento. Sem secar-se, entrou na igreja, encharcada. Dera-se completamente e com a espontaneidade a que seu marido jamais teria acesso. Corrompera-se, perdera-se na chuva e exibia as provas de sua traição aos convidados indignados. Enquanto a marcha nupcial abrupta e confusa se anunciava, Raíssa caminhava pela igreja, assoviando, profanamente, o tema de Cantando na Chuva.

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